O
CPTA tem instituído no seu cerne um regime dualista no que toca ao contencioso
administrativo pré-contratual. A impugnação de actos administrativos pré-contratuais
remete para um de dois campos: em primeiro plano para a acção administrativa
especial, como regra; em segundo plano para o regime do processo urgente de
contencioso pré-contratual[1]. Este
regime acaba por se diferenciar, em termos sintéticos, quanto aos prazos e a
própria marcha do processo, sendo que é muitas vezes descrito como uma acção
administrativa especial com tramitação acelerada com prazo de propositura mais
curto. De acordo com o artigo 46, nº3, o regime especial referido que o CPTA
institui nos artigos 100 e seguintes[2] só vale
para a impugnação de actos relativos a formação dos contratos lá referidos,
acolhendo claramente uma demonstração do caracter imperativo do regime legal.
Parece oportuno assinalar o facto de urgência
estar pressuposta sempre, em abstracto no processo. Esta ocorrência tem o seu
alcance na tramitação processoal, com um foco associado a rapidez do mesmo que
que acaba por colocar como refere Pedro Gonçalves o interesse concreto do autor
para segundo plano. Será legítimo perguntar, se esse mesmo preceito, o da rapidez
processual, não devera ser um ponto que se procura em todas as acções
administrativas, ou pelo menos na sua tramitação processual? Não podemos dar
uma resposta afirmativa à questão, contudo como vamos ver infra, o objecto
deste processo acolhe em si elementos que revelam um carácter “prioritário”,
que urge de normas definidas para os Estados Membros, alinhadas com a possível
irreversibilidade dos contratos.
As
características do processo possibilitam a percepção que o foco do meio
processual não se incide na protecção dos particulares. Embora, o autor retire
“dividendos” no caso, seja o de participar no processo contratual, seja a
evitar a celebração do mesmo, este não e o núcleo pelo qual o processo se desenrola.
A tutela da pretensão do autor acolhe maior relevância, quando nos remetemos
para um sistema de providências cautelares, que não só permitam mante-lo no
procedimento como também impedir a celebração do contrato, assim como noutro
plano permitir o alargamento do processo de impugnação dos actos
pré-contratuais ou o reconhecimento da legitimidade activa na acção a propor
para invalidade do contrato.
O
regime das providências cautelares relativas a procedimentos de formação de
contratos, consagrado no CPTA, abarca não só as possibilidades referidas supra,
como tem uma aplicação para a acção administrativa especial. Deste modo,
esgrime-se mais um argumento que vem fundamentar que o interesse opositivo do
autor de evitar celebração do contrato, não se concretiza mais eficientemente, só
porque se recorreu (havendo possibilidade) ao processo urgente de contencioso pré-contratual.
Desta
forma, observando o predisposto no CPTA, com referência ao defendido, podemos
afirmar, que a figura em causa justifica um processo urgente (visto que
urgentes seriam todos), com um princípio de interesse público, cimentado na
procura de uma estabilização dos processos pré contratuais. Este preceito
procura construir um regime que sirva efectivamente à possibilidade efectiva de
uma impugnação de actos pré-contratuais antes da consumação do negócio ou do início
da sua execução. O grande problema que se procura solucionar é o risco
adjacente à consolidação de uma situação irreversível consequência da entrada
da execução do contrato, que por sua vez inviabilize, o interesse da empresa
impugnante e dos princípios procurados. Este ponto, assume-se como a principal
preocupação emanada das directivas comunitárias[3] Estas
que acolhem um papel de destaque no acolhimento desta figura no regime jurídico
português. Mário Aroso de Almeida refere que o acolhimento do processo
contencioso pré contratual em Portugal, fundamenta-se com as varias directrizes
comunitárias, sendo que grande parte dos artigos do regime resultaram do DL nº
134/98 15/5. Para evitar este problema, o alargamento da legitimidade para
impugnação do contrato e as providências cautelares, cimentam a resposta a esta
preocupação. Demonstra-se assim claro, que independentemente da posição que se
tome quanto a importância ou mesmo essencialidade das normas comunitárias no
regime adoptado em Portugal, denota-se uma (conveniência) sensibilidade para
estes preceitos por parte da U.E
Sem
Alargar demais a temática, parece-me relevante, debruçarmo-nos sobre o âmbito
do processo urgente de contencioso pré- contratual. Os Artigos 100 e seguintes
do CPTA, acolhe uma minuciosa delimitação deste processo autónomo. Existe uma
mínima taxatividade, abarcando um processo virado para as necessidades que o
direito europeu parece desenhar em termos de contratação pública (observando-se
assim uma fundamentação Regime consequências do europeu). Desta forma, no
seguimento do DL nº134/98 15/5, este parece a percepção a acolher, tendo como
exemplo o afastamento desta figura, em situações de concessão de serviços
públicos, ou a exploração de sectores anteriormente vinculados ao domínio
publico.
Cabe
debruçarmo-nos, sobre os motivos que levaram a não incorporação deste tipo de
contratos no regime jurídico do contencioso pré-contratual urgente. Analisando
este tipo de contratos, verificamos que também são contratos precedidos de
procedimentos pré-contratuais de direito público. Assim, faria sentido elenca-los
no tipo de problema já referido e dá-los a mesma solução. O cerne da questão poder-se-ia
colocar, quanto a banalização da “urgência”, isto é, um desgaste do processo
que colocaria em causa os objectivos procurados com a sua existência. Daí que
teria de haver um cuidado no alargamento dos preceitos a elencar na figura.
Este tipo de contratos referidos (concessões de serviços públicos de uso
privativo ou de exploração do domínio publico), não acolhem assim uma parte tão
representativa que possa congestionar o processo, ou fazê-lo menos eficaz.
Contra a solução legislativa adoptada encontra-se Vieira de Andrade, que parece
entender que este processo deveria ser aplicável a qualquer contrato, e não
apenas a estes quatro tipos específicos de contratos: “ Não se percebe, porém,
porque é que esse meio só vale para os contratos abrangidos ou abranger pelas
directivas comunitárias, como se não fosse uma boa solução para a generalidade
dos contratos[4].
Porém, deve ser feita uma ressalva, quanto
acolhimento de todos os processos de adjudicação. Hoje em dia, são muito frequentes
os casos de adjudicação tanto de licenças, autorizações associados a contingentação
de acesso ao mercado). Este movimento consubstancia a discussão de que ate que
ponto se alinha o interesse público, na rápida estabilização de procedimentos
de adjudicação, ou no início do funcionamento de licenças e autorizações, para
que os beneficiasse com um regime processual excepcional como e o Processo de contencioso pré-contratual urgente
Em jeito conclusivo, após o exposto, ficou evidenciado
os objectivos por detrás deste regime especial afigurando-se ser de todo
conveniente manter esta figura no ordenamento jurídico (até para fazer eco das directivas
comunitárias), tendo como finalidade procurar anular as lacunas que lhe estão
adjacentes, para que possamos ter um regime realmente célere, efectivo,
consagrando prazos mais curtos e uma tramitação mais veloz. Visto que, nem que
não seja pela necessidade que o interesse público supra referido em ter um regime
“urgente”, visto que a urgência não se esgota nestes casos, existe
efectivamente sempre.
[1] Sobre o
processo urgente contencioso pré- contratual, cf. J.C Vieira de Andrade, A
justiça Administrativa, Coimbra, Almedina, 2006, pp. 263 e ss; Mário Aroso de Almeida,
O novo regime do processo nos Tribunais Administrativos, Coimbra, Almedina,
2005; Isabel Celeste Fonseca, Dos novos processos Urgentes no Contencioso
Administrativo, Lisboa, LEX, 2004, pp. 72 e ss.
[2] Em
termos de prazos, um exemplo, Acórdão nº00655/05 Tribunal Central
Administrativo Sul
[3] Directivas nos 89/665/CEE e
92/13/CE.
[4] Carlos
Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa (Lições), 8ª edição, p.264.
David Silva Rodrigues Nº 19573
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