O direito a uma tutela
judicial efetiva para defesa de direitos e interesses legalmente protegidos vem
consagrado no n.º 4 do artigo 268.º da Constituição, mediante a adoção de
medidas cautelares adequadas.
Conferindo
desenvolvimento ao preceito constitucional, o Código de Processo nos Tribunais
Administrativos regula os processos cautelares nos termos dos artigos 112.º e
seguintes.
Antes, logo na sua
parte introdutória, o artigo 2.º do CPTA vem assegurar o direito à obtenção das
providências cautelares indispensáveis e adequadas a assegurar o efeito útil
das decisões que vierem a ser proferidas pelos tribunais administrativos.
O artigo 113.º, n.º 2
refere que o processo cautelar é um processo urgente e tem uma tramitação
autónoma face ao processo principal, sendo apensado a este.
As providências
cautelares, que podem ser antecipatórias ou conservatórias, destinam-se a
assegurar a utilidade da sentença a proferir no processo principal. Conforme preconiza o Supremo Tribunal Administrativo no
Acórdão relativo ao Proc.º 0539/12, visam impedir que aquela sentença fique
desprovida do seu poder regulador em virtude da alteração substancial da
realidade de facto, entretanto ocorrida.
Neste sentido, Vieira
de Andrade - in Justiça Adminitrativa (Lições), 11.º edição – afirma que “os
processos cautelares visam especificamente garantir o tempo necessário para
fazer justiça”.
A título
exemplificativo, o CPTA prevê que as providências cautelares possam consistir
designadamente na suspensão da eficácia de um acto administrativo ou de uma
norma; na admissão provisória em concursos e exames; na atribuição provisória
da disponibilidade de um bem; na autorização provisória ao interessado para
iniciar ou prosseguir uma actividade ou adoptar uma conduta; na regulação provisória
de uma situação jurídica; na intimação para a adopção ou abstenção de uma
conduta por parte da administração ou de um particular, por alegada violação ou
fundado receio de violação de normas de direito administrativo.
As providências
cautelares caracterizam-se:
- pela sua
provisoriedade, pois só vigoram enquanto o processo principal não for julgado;
- pela sua
instrumentalidade, pois asseguram que a decisão a proferir possa ter utilidade;
- pela sua precariedade,
pois os juízos que o Tribunal aí faz são sumários, susceptíveis de virem a ser
alterados.
Quanto aos critérios que
poderão determinar a adopção de uma providência cautelar encontram-se fixados
no artigo 120.º do CPTA.
Desde logo, quando seja
evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo
principal. Vieira de Andrade (in obra referida) salienta que este é decisivo “por
ser, em princípio, o único factor relevante para a decisão de adopção da
providência cautelar em caso de evidência da procedência da pretensão
principal, designadamente por manifesta ilegalidade do acto”.
Carla Amado Gomes, citada
por Catarina Moreno Pina (na Tese “Providências Cautelares a 120.º … mas com critérios:
no âmbito do contencioso administrativo”, 2007) defende que nesta alínea está
em causa em simultâneo “a salvaguarda do interesse público … e a tutela de interesses
privados”.
No entanto, conforme
tem sublinhado o Supremo Tribunal Administrativo, a evidência de que fala a alínea
a) do n.º 1 do artigo 120.º não deixa de ser uma evidência provisória, pois
poderá ser sempre revista na acção principal em função dos novos elementos que
aí se recolham ou até em função de uma reapreciação mais aprofundada e
ponderada dos elementos já existentes – vide o Proc.º 0539/12, de 26-9-2012.
Um segundo critério é o
estabelecido na alínea b), do mesmo número 1, ou seja, quando, no caso de
providência conservatória, haja fundado receio da constituição de uma situação
de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os
interesses que o requerente vise assegurar no processo principal (periculum in
mora) e não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a
formular nesse processo ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu
conhecimento de mérito (fumus boni iuris).
Já na alínea c),
prevendo-se o caso de providência antecipatória, quando haja fundado receio da
constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de
difícil reparação para os interesses que o requerente pretende ver reconhecidos
no processo principal (periculum in mora) e seja provável que a pretensão
formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente (fumus
boni iuris).
No que respeita ao
fumus boni iuris, este pode, assim, assumir uma formulação positiva
(probabilidade de êxito do recurso principal) ou negativa (basta que o recurso
principal não apareça desprovido de fundamento) – vide neste sentido o Acórdão STA
relativo ao Processo n.º 0857/11, de 12-1-2012.
Neste contexto,
Catarina Moreno Pina (in obra referida) afirma: “se por um lado o periculum in
mora é a razão de ser da providência, o fumus boni iuris é o que confere «seriedade
jurídica ao processo» (…) Ambos os requisitos têm de se verificar para a
adopção da providência.”
Importa ainda ressalvar
que, de acordo com o estatuído no n.º 2, do mesmo artigo, nas situações
previstas nas alíneas b) e c) vindas de referir, a adopção de uma providência
cautelar pode contudo ser recusada quando, devidamente ponderados os interesses
públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se
mostrem superiores àqueles que podem da sua recusa, sem que possam ser evitados
ou atenuados pela adopção de outras providências.
Encontra-se plasmado
neste normativo o chamado princípio da proporcionalidade na decisão de
concessão da providência. No dizer de Vieira de Andrade (in obra referida), “mesmo
que se verifiquem os requisitos fundamentais – quer o periculum in mora, quer o
fumus boni iuris (…) – o juiz deve recusar a concessão da providência cautelar,
quando o prejuízo resultante para o requerido (…) se mostre superior ao
prejuízo que se pretende evitar com a providência”.
Também Mário Aroso de
Almeida, citado por Catarina Moreno Pina (in obra referida), preconiza a este
respeito: “A demonstração do periculum in mora e do fumus boni iuris coloca
assim o requerente numa posição de partida favorável à obtenção da providência.
O artigo 120.º , n.º 2, introduz, no entanto, uma cláusula de salvaguarda neste
domínio, ao permitir que, no interesse dos demais envolvidos, a providência,
ainda assim possa ser recusada quando, pese embora o preenchimento, em favor de
requerente, dos requisitos previstos nas alíneas b) e c) do n.º 1, seja de
entender que a concessão da providência provocaria danos (ao interesse público
e de eventuais terceiros) desproporcionados em relação àqueles que pretenderia
evitar que fossem causados (aos interesses do requerente da providência).”
Assim, como foi
decidido no Acórdão STA relativo ao Processo n.º 0239/12, de 11-4-2012, quando
o interesse público sobreleva o interesse privado da requerente, resolve-se a
ponderação de interesses com o indeferimento da providência.
Isto é, a verificação dos três requisitos
periculum in mora, fumus boni iuris e ponderação de interesses, tem que ser
cumulativa, conforme se preconiza no já citado Acórdão STA – Proc.º 0857/11, de
12-1-2012.
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