As
providências cautelares são uma via processual de tutela urgente, que asseguram
a utilidade da lide.
Vêm em
primeira linha evitar que a morosa actuação de um tribunal culmine na perda de
interesse processual pela parte que realiza o pedido.
Sabendo hoje a
sua imperiosa importância, por radicar no princípio da tutela jurisdicional
efectiva dos particulares perante a Administração, plasmado nos artigos 268º/4
e 20º/4 da Constituição da República Portuguesa, desde 2007, a existência fraca
(em número e funcionalidade) das providências cautelares nem sempre garantirem
em pleno a protecção dos particulares através dos tribunais.
Antes da
chegada do CPTA a matéria era regida pela LOSTA e RESTA[1],
que no entanto apenas consagravam como providência cautelar única a “Suspensão
de executoriedade do acto”. Esta era mais restrita que a providência cautelar
da posterior LEPTA[2] de 1985,
que consagrava a “suspensão da eficácia do acto”, uma vez que a primeira só se
reportava a casos de susceptibilidade coerciva imediata por via administrativa.
A LEPTA estende portanto os efeitos jurídicos de um acto até à sua totalidade. Esta
era a única providência cautelar expressamente consagrada[3]
e ainda assim inserida no capítulo dos “meios processuais acessórios” que
compreendia outras figuras que nada tinham a ver com a supra referida pois,
apesar de poderem ser acessórios, têm carácter definitivo (ao contrário das providências
cautelares). O capítulo compreendia também a “intimação para um comportamento”
que seria um meio cautelar, mas que apenas valia contra particulares. A suspensão
de eficácia dos actos teria ainda alguns problemas: só se referia a actos de
efeitos conservatórios (quanto ao conteúdo) e só se aplicava a actos
administrativos de conteúdo positivo (quanto ao objecto) pois, entendia a
doutrina e jurisprudência[4],
levaria o tribunal a substituir-se à Administração (pondo em causa a separação
de poderes). Contra, manifestava-se Cláudio Monteiro[5].
Tinha também problemas quanto ao seu critério de concessão (uma vez que não atendiam
à probabilidade, mas à irreparabilidade do dano decorrente da execução do acto)
e à falta de possibilidade da suspensão de eficácia das normas, deixando o
particular desprotegido.
Pós revisão
constitucional de 1997 a doutrina começa a mudar de posição e a exigir a aceitação
de qualquer providência permitindo uma maior protecção do particular contra a
Administração e tutelando os seus direitos ao máximo. A jurisprudência começa também
a admitir, embora com pouca aplicação prática as providências cautelares inominadas.
O actual CPTA, ao consagrar a condenação à prática de acto devido vem por termo
à discussão, permitindo a suspensão de eficácia do acto negativo (pois a cada
acção caberá a providência cautelar e idónea à eficácia da sentença final).
O processo
cautelar tem características que o individualizam: instrumentalidade[6],
sumaridade [7]e
provisoriedade[8].
O legislador
consagrou não só uma cláusula aberta no artigo 112º/1 CPTA (desde que não
invada espaço de discricionariedade da Administração), como apresentou uma
lista de providências cautelares antecipatórias (que obtêm o bem que o
particular tenha direito ou que alterem o status quo existente) e conservatórias
(mantêm o status quo e retêm a posse do bem ou direito que o particular esteja
em vias de perder). Existe um leque vasto de providências cautelares
administrativas (hoje em dia temos um modelo cautelar pleno, em contraste com o
anterior modelo monista).
Cabe ainda referir
que no caso de decretamento de providências cautelares positivas estas devem
ser realizadas com ponderação de dois equilíbrios: princípio da prossecução do
interesse público e do respeito por direitos e interesses legalmente protegidos
do cidadão.
Quanto aos pressupostos gerais,
dividi-los-emos:
·
Periculum in mora – É o receio fundado na
constituição de um facto consumado ou de prejuízos de difícil reparação. Surgia
este na alínea b) do anteprojecto de 2000, permitindo a adopção de providências
cautelares apenas baseadas nesta alínea, sem referência ao fumus boni iuris.
·
Fumus boni iuris – É a avaliação sumária do
êxito da acção principal. No caso das providências cautelares conservatórias
basta um fumus non mali iuris (a não manifesta ausência de fundamentação da
pretensão do requerente). Nas providências cautelares antecipatórias é
necessário considerar provável o êxito da acção principal. No anteprojecto de
2000 surgia no artigo 110º/1 a) e exigia a probabilidade séria da procedência da
pretensão formulada ou a formular no processo principal. Vasco Pereira da silva
criticou esta formulação pois considerou que implicaria a obrigação por parte
do juiz de antecipar juízo da questão principal tornando mais difícil a
obtenção de providências cautelares[9].
Actualmente, até os requisitos das providências cautelares antecipatórias são
menos exigentes.
·
Ponderação proporcional de interesses públicos e
privados – Tem de existir uma ponderação da necessidade de concessão das
providências cautelares, que são susceptíveis de intromissão na liberdade da
conformação administrativa e de prejuízo dos interesses dos requeridos e
contra-interessado
Quanto às antecipatórias,
acresce:
·
Adequação - O tribunal pode adoptar providências
cautelares não requeridas concretamente para evitar lesão de direitos de
requerente e para ser menos gravosa para interesses públicos e privados em
jogo.
Rita Camilo - nº 19835
Rita Camilo - nº 19835
[1]
Lei Orgânica do Supremo Tribunal Administrativo e Regulamento do Supremo
Tribunal Administrativo
[2] Lei do Processo nos Tribunais Administrativos
[3]
Art. 76º LEPTA
[4] Freitas do Amaral e Processo 6057/02 de
21/02/2002
[5]
Cláudio Monteiro, A suspensão de eficácia dos actos administrativos de conteúdo
negativo, Faculdade de Direito de Lisboa, página 157
[6]
As providências cautelares visam assegurar a utilidade da lide, e não
decidi-la. O juiz deve abster-se de antecipar a decisão do juiz de julgamento.
[7]
O decretamento da providência deve assentar na apreciação sumária dos factos,
num juízo de mera probabilidade.
[8]
A decisão tem carácter temporal limitado e não faz caso julgado
[9]
Vasco Pereira da Silva, “Vem aí a reforma do Contencioso Administrativo”, in
Reforma do Contencioso Administrativo – Trabalhos Preparatorios – Debate Universitário,
Vol. I, Ministério da Justiça.
Sem comentários:
Enviar um comentário