Os requisitos a preencher para que
possa ser concedida uma providência cautelar (inominada) em processo
administrativo estão previstos no artigo 120º do Código de Processo nos
Tribunais Administrativos.
De forma genérica podemos começar
por referir que são três os pressupostos que têm de estar verificados:
· O periculum
in mora
· O fumus
boni iuris
·
A ponderação de interesses.
Quanto ao periculum in mora está previsto nas alíneas b) e c) do
artigo 120º/1 CPTA correspondendo a “fundado receio da constituição de uma
situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação
para (…) o requerente”. Este requisito traduz-se na existência de um motivo que
justifique a tutela cautelar, ou seja, terá de ser necessário decidir de forma
provisória sob pena de não estar acautelado o efeito útil da decisão definitiva
do tribunal.
Anteriormente, o regime apenas
mencionava a hipótese de um prejuízo de
difícil reparação agora acrescenta-se a situação de facto consumado, assim se torna possível concluir que não está
apenas em causa a possibilidade de os eventuais danos causados ao requerente
não poderem ser avaliados em termos monetários mas também as situações em que
podendo ser feita esta avaliação, ainda assim, a reintegração total da
legalidade da situação não é possível[1].
Há ainda os casos em que o dano causado ao requerente pela não concessão da
providência poderá ser de difícil reparação, visto que a reintegração no plano
dos factos será difícil ou que sempre haverão danos que se produzirão ao longo
do tempo. Tudo se reconduz, no fundo, à ideia de assegurar a utilidade da
decisão final.
Defende o professor Mário Aroso de
Almeida que a avaliação do periculum in mora deve ser efectuada pelo juíz de
acordo com uma lógica de sumariedade[2]
(o que implicará apenas um juízo de probabilidade), que uma das características
gerais do processo cautelar.
Relativamente ao fumus boni iuris há que referir
que este consiste na existência de uma aparência de bom direito, ou seja, na ideia
de que a pretensão do particular no processo principal pode ser considerada
procedente. No entanto este critério é estabelecido de forma gradual nas
alíneas a), b) e c) do artigo 120º/1 CPTA, pois tem intensidades diferentes em
cada uma delas.
Na alínea a prevê-se uma situação em que é “evidente a procedência da
pretensão formulada ou a formular”, será então claro que o pedido do requerente
será considerado procedente e nessa medida faz sentido que seja concedida a
providência. É consensual na doutrina que se prescinde da verificação do
requisito da ponderação de interesses (constante do artigo 120º/2 CPTA), o que
se justifica pela intensidade do critério do fumus boni iuris, pois sendo evidente a procedência do pedido do
particular não vale a pena adiar a decisão.
Já o que diz respeito à avaliação
do periculum in mora quando esteja em
causa uma situação que recaia nesta alínea, é duvidoso saber se este requisito
será ou não aplicável. Comparando o teor da alínea a) com o das alíneas b) e c),
as últimas fazem menção expressa ao periculum
in mora, ao passo que esta nada diz, pelo que parece ser discutível se ele
terá ou não de estar verificado. Segundo a posição de Mário Aroso de Almeida
tal requisito não seria exigível porquanto nestes casos não se pode restringir
a tutela dos direitos do particular só porque não há quanto aos mesmos um
fundado receio de lesão, para o professor trata-se de uma situação em que de
nada vale adiar o inadiável e por isso a tutela cautelar deve ser concedida. No
entanto o professor reconhece que não sendo um caso em que a providência visa
acautelar a utilidade da decisão principal, parece que estamos perante uma
modalidade de tutela sumária acessória ao invés de uma providência cautelar[3].
No entanto, há também quem defenda
que pela inclusão sistemática do artigo 120º/1 a) CPTA estamos perante uma
providência cautelar e nessa medida terá de ser exigível o periculum in mora, sob pena de não haver interesse em agir e de não
se poder conceder a providência. Ainda quanto à alínea a) é de referir tem tido
muito pouca aplicação prática, pois a jurisprudência aplica os seus requisitos
de forma tão exigente que raros são os casos em que eles se encontram
preenchidos.
Atendendo agora à alínea b) do
artigo 120º/1 CPTA, esta rege a concessão de providências cautelares
conservatórias (ou seja, está em causa a manutenção do statu quo), quando “não
seja manifesta a falta de fundamento da pretensão”. Aqui a aparência de bom
direito aparece formulada de forma negativa, desde que não existam elementos
que permitam concluir que a pretensão material do particular será negada, a
providência deverá ser concedida. Há que ter em conta que se trata de uma
situação em que o particular apenas requer que se mantenha a realidade como era
até àquele momento, não estando em causa nenhuma alteração pelo que esta é esta
a alínea em que temos uma menor intensidade do fumus boni iuris.
A alínea c) do artigo 120º/1 impõe
os requisitos das providências cautelares antecipatórias (aquelas em que se
pretende modificar ou inovar o statu quo),
aqui o critério da aparência de bom direito é mais exigente pois tem de ser
provável que a pretensão do particular no processo principal venha ser julgada
procedente. Estando-se numa situação em que o requerente pretende que se altere
a situação de modo a que lhe seja mais favorável, faz sentido que lhe seja
exigido que demonstre que tem razão.
Resta analisar o critério da ponderação
de interesses, como já foi referido este não se aplica no caso do artigo
120º/1 a) CPTA, mas é condição de concessão das providências cautelares
previstas nas alíneas b) e c) do mesmo artigo, mesmo que se verifiquem os
outros dois requisitos, este tem de estar preenchido para que se conceda a
providência. Está aqui em causa um juízo de proporcionalidade dos interesses em
causa que serão os do requerente e os interesses afectados pela concessão da
providência. Note-se que anteriormente ao CPTA se tratava este critério como
uma ponderação entre o interesse privado e o interesse público, e sendo este
último afectado a providência não era concedida, o que conduzia a uma parca
aplicação de mecanismo das providências cautelares.
Actualmente aquilo que tem de ser
feito é um juízo de valor relativo, uma justa comparação dos interesses em
presença de modo a que se perceba se as vantagens concedidas ao requerente vão
ser superiores aos danos eventualmente causados ao requerido.
Para concluir diga-se que temos um
regime de concessão de providências cautelares cuja aplicação é relativamente
fácil (especialmente quando se compara o regime actual com aquele que o
precedeu), o que vai de encontro à ideia de tutela dos direitos dos
particulares no contencioso administrativo. Por isso mesmo, as providências
cautelares são um meio processual muito usado.
[1]
Tome-se como exemplo o caso em que é pedida uma providência cautelar para
evitar que um prédio seja demolido (estando a mesma situação a ser discutida no
processo principal). Nesse caso, sabe-se qual o valor do prédio, mas esse valor
não corresponde ao dano sofrido pelo requerente visto que se no processo
principal lhe for dada razão ele terá direito a reconstruir o prédio mas isso
custar-lhe-á tempo e incómodo, o que podia ser evitado se a providência
cautelar assegurasse que o prédio não seria demolido até o tribunal decidir de
forma definitiva.
[2] Vide, Mário Aroso de Almeida, “Manual de
Processo Administrativo”, pág. 476.
[3] Vide, Almeida, Mário Aroso de; “Manual de Processo Administrativo”, pág. 226.
Mariana Gameiro Branco, nº 19752
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